segunda-feira, abril 21, 2008

Amelie


Seria um dia como outro qualquer, se não resolvesse comprar flores antes. Mas por que comprar flores se é um dia normal? - aliás o que é a normalidade? Isto não vem ao caso agora . Esta é a pergunta que paira, paira sobre mim também, apesar de eu ser seu criador não sei o porquê de uma criatura querer flores numa segunda-feira, nem feriado é. Apenas sei que Amelie acordou com uma vontade de comprar flores, feito desejo de grávida que acorda na madrugada querendo as mais estranhas guloseimas. Tomou seu banho, colocou seu perfume, se é que podemos chamar perfume uma coisa que tem cheiro de flor de defunto,vestiu-se com todos os seus panos,cinta liga,espartilho,deixou o peito nu e uns cinco ou seis colares, jogou sobre si seu vestido de tafetá rosa e sai de casa, na esperança de não comprar apenas flores, mas também encontrar alguém que mate sua ânsia.
Com todos os seus adornos, sai do seu cubículo desfilando na ponta do seu salto 15, desce as escadas que dá na porta, abre o portão e sai como uma gazela. A cada passo dado um olhar em sua direção. Com a delicadeza de cada passada seu corpo parece sincronizado, o balançar do quadril acompanhado da firmeza dos ombros e do nariz pequeno empinado passam sua altivez, o cigarro no lábio carnudo pintado com um batom vermelho sangue mostra sua lânguida face.
A sinuosidade do seu corpo – parece boneca moldada com a maior perfeição possível: o quadril na mesma proporção dos ombros, enquanto a cintura fina sustenta toda a estrutura - atrai a atenção de todos da rua que dá para a floricultura, um homem se choca em um poste, uma mulher esquece sua cria e a acompanha.
Passa arrogante, sem encarar ninguém; o mundo exterior não existe para ela, apenas seus mundos interiores, cheios de devaneios. Um misto de doçura e arrogância feito delicadeza de rio e violência de mar em dias tempestivos. Seus traços delicados lembram boneca de porcelana, enquanto seu andar mostra uma experiente cortesã.
As vitrines das lojas perdem o encanto, todos param de fazer o que estão fazendo para olhar para ela. Seria ela um manequim de pele, carne, osso e sensualidade? Uma ventania levanta seu vestido, e balança seu cabelo curto, de tão liso assemelha-se a uma peruca.
Finalmente, chega à floricultura.
“Bom dia senhor, quero uma orquídea.” - diz.
O vendedor não sabia se olhava para as flores ou se olhava para ela. Como pode uma dama ofuscar a beleza e a delicadeza de uma orquídea?
“Tem alguma preferência?” – interroga o vendedor.
“Quero aquela” – diz apontando para uma orquídea com tons pastéis.
“Pois não, senhorita.” – entrega o vazo com as mãos trêmulas, a beleza de Amelie o deixou balançado.
Despede-se, e começa o caminho de volta.
Quando de súbito seu olhar se cruza com o de um menino de aparentemente 12 anos – cabelo ruivo, face sardenta. E o convida para acompanhá-la.
Todos os homens desejosos de seu convite, pasmam. E não entendem. O que uma dama faria com uma criança saída das fraldas há pouco?
Desfila de volta para casa de mãos dadas com o guri. Chegam, abre o portão, sobem as escadas, e entram no quarto.
Ela olha para ele e diz:
“ Quer jogar videogame comigo?”
Ele sorri e balança a cabeça positivamente.
Um menino, uma mulher e a inocência disfarçada.

3 comentários:

teleférico amarelo da cor azul do ocre verde mar. disse...

A cada novo texto seu, uma nova aventura e no fim, uma surpresa muito boa =P~
E eu que no começo deste texto senti uma certa repulsa por Amelie, no final, me rendi a sua inocência reservada.

Anônimo disse...

Acho que esse texto é digno de muitos elogios. Você procurou demonstrar que as pessoas necessitam de coisas simples, como: a cumplicidade de um olhar, de um toque, de uma companhia para realizar coisas até banais, ou seja, as pessoas saem às ruas a procura de pessoas.

ಌ Debbynha ಌ disse...

Eu kro jogar video game tb xP

Todos pensaram mtas coisas com seus pensamentos poluidos, mais ela eh pura, ou ao menos, parece ser...

s2

;**